28 resultados para Anselmo


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Numa revisitação do Proslogion anselmiano, busca-se tentar descodificar a sua complexidade em função das duas vertentes razão e mística, positividade e negatividade. Inserindo-se o texto numa linha de interioridade nítida, nele ressalta o significado da formulação do célebre argumento, encontrada a esse nível, para tentar expressar Deus e demonstrar lógica e rigorosamente, em toda a plenitude da razão, a sua necessária existência, como caso único e excepcional: aliquid quo nihil maius cogitare possit. Pode afirmar-se que o raciocínio no seu encadeamento racional se estrutura sem falhas, afastando qualquer confusão entre o nível do conceptual e do real, chegando a uma conclusão necessária e irrefutável, se se aceitarem os mesmos pontos de partida. A utilização dos termos aliquid e id impede que essa formulação possa ser considerada como definição ou conceito, fechados em si mesmos, tal como a sua expressão de negatividade, na sua indeterminação, desvela uma necessidade urgente e contínua do racional se ultrapassar a si mesmo, num caminho de algo apenas pressentido. Esta perspectiva, que se conexiona em última análise com a perspectiva dupla da própria Revelação como desocultação/ocultação, projecta-se no próprio texto, o qual como que se cinde a partir do capítulo XIII, na análise dos atributos de Deus, deixando de lado uma via de positividade que se esgota e abrindo-se à negatividade. Se a ratio pode argumentar, concluir e chegar à descoberta de um argumento estruturado e coerente, com amplitude universal, apercebe-se, igualmente, das suas limitações. O alargamento máximo das capacidades da razão para chegar a Deus, não basta a Anselmo, já que experiencia, paralelamente, o seu desespero em não conseguir ver a Sua face. É essa tensão subjacente a todo o texto do Proslogion e mais claro ainda nos últimos capítulos, que desvela a dialéctica da razão e da mística, interagindo, sem que se misturem os seus processos, os seus métodos e as suas linguagens, desencadeando, afinal, uma busca sempre inconclusa do Absoluto. Este dinamismo processual de forças em presença que, mergulhando as suas raízes nos Platonismos clássicos transmutados pela Patrística, virá a aflorar, claramente, na mística especulativa do século XII, marca fundamente o pensamento medieval. Com efeito, nele estão sempre presentes, um entendimento lúcido da razão e a confiança nas suas capacidades especulativas, e, paralelamente, o reconhecimento claro da sua relatividade e o apelo de uma Presença pressentida mais do que pensada. Assim a razão é impedida de se fechar em círculo, já que tenta, sempre, chegar ao Absoluto que não a determina, mas que a motiva incessantemente, para além do humano.

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O Opúsculo em favor do insensato de Gaunilo constitui uma cerrada discussão filosófica da expressão “esse in intellectu” (existir no intelecto), ponto determinante do argumento construído por Anselmo no Proslogion II-III para demonstrar a verdade da existência de Deus a partir da existência no intelecto da sua definição enquanto “algo maior que o qual nada pode ser pensado”. Analisam-se aqui as razões de Gaunilo e as suas concepções de intelecção e de cogitação para desmontar o ponto de apoio principal do argumento de Anselmo, que, por sua vez, respondeu ao seu crítico com um Livro apologético. Indaga-se, em consequência, a clarificação por Anselmo sobre a intellectio e a cogitatio e se nela os dois conceitos são reposicionados para evitar as críticas de Gaunilo e assim continuar a manter que a razão, por si mesma, sem auxílio da experiência ou da fé, pode obter a certeza da existência que refuta o dito do insensato “Deus não existe”.

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Pode-se dizer que o Proslogion é uma meditação sobre o ser de Deus, realizada por um espírito que busca entender aquilo que inicialmente crê. Sua articulação conceitual é comandada pela presença do argumento único, que ao reconhecer que Deus é, aponta igualmente o modo pelo qual a criatura pode conceber algo de apropriado a respeito dele. O Proslogion nos oferecerá um caminho para pensar o sentido da busca de ‘razões’ no domínio exclusivo da fé, do esforço da palavra humana para encontrar aquilo que já fora dito por uma outra palavra. O objetivo deste estudo é considerar o sentido dessa racionalidade, do papel exercido pela razão no interior da inteligência da fé. Na primeira parte, aponto a tripla constituição do Proslogion, como exortação (excitatio), prova (probatio) e alegria (gaudium) final esperada pelo homem. Na segunda parte, indico o debate sobre a cogitatio humana, formulado na crítica de Gaunilo ao argumento e a conseqüente réplica de Anselmo.

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O objecto deste estudo teve a intenção de apresentar algumas afinidades de linguagem e de raciocínio entre o segundo livro do De libero arbitrio de Santo Agostinho e os primeiros três capítulos do Proslogion de Santo Anselmo, a respeito da prova da existência de Deus. Com efeito, para a maior parte dos augustinianos, e até mesmo dos anselmianos, há verdadeiramente uma filiação do pensamento de Santo Anselmo em Santo Agostinho. Podemos dizer que Anselmo de Cantuária é o principal propagador, ainda que de uma forma inovadora, de um certo pensamento augustiniano, que se reflecte na sua obra e, nomeadamente, no Proslogion. Esta influência denota, ao mesmo tempo, uma proximidade textual e conceptual, de que é a fonte criadora para o monge de Bec. De facto, para bem destrinçar os antecedentes do pensamento anselmiano, é preciso encontrar os princípios de formulação racional, que são semelhantes em Anselmo e Agostinho. Ora, foi nisso que consistiu o nosso trabalho, tanto mais que, entre os trabalhos existentes, assiste-se a uma abordagem menos desenvolvida a este propósito.

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Com base em De musica de Santo Agostinho e em De veritate de Santo Anselmo, propõe-se a articulação do conceito agostiniano numerus com o conceito anselmiano rectitudo. Embora pertençam a idiolectos distintos, e apesar dos sete séculos que separam os textos em questão, numerus e rectitudo apresentam um mesmo valor de síntese e um mesmo modo de existência que é, simultaneamente, causa e medida de conformidade das coisas em relação à essência da qual provêm. A articulação destes conceitos constituirá, pois, a base para uma análise do papel dos sentidos na percepção dos elos divinos presentes no mundo sensível e na capacidade humana de conhecer Deus.

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O presente artigo é parte do resultado da investigação de um programa de pós doutoramento e pretende confrontar algumas doutrinas de Agostinho de Hipona sobre os conceitos de livre arbítrio e de verdade, desenvolvidas no De libero arbitrio, e aquelas expostas por Anselmo de Canterbury, sobre as mesmas noções, nos Três Tratados sobre a Sagrada Escritura – De veritate, De libertate arbitrii e De casu Diaboli. Ao indagar os fundamentos teóricos da definição anselmiana de veritas como rectitudo, verificam-se algumas conexões entre os postulados da noção de Anselmo sobre a verdade e aqueles estabelecidos por Agostinho para a mesma noção. Neste artigo, evidenciam-se três pontos de convergência entre as doutrinas de ambos os autores: 1. o fundamento do conceito de coisas verdadeiras num Princípio de Ser que é racional, eterno e subsistente per se. 2. a noção de dever-ser (débito ontológico) fundamentada no facto de as coisas receberem o ser e a verdade daquele Princípio. 3. a concepção segundo a qual todos os seres se realizam executando o seu fim específico. Ao fazê-lo, a verdade deles realiza-se como rectitudo. Dado que os seres racionais podem reconhecer o seu próprio fim, realizam-no mediante livre escolha. Quando esta espécie de seres escolhe o seu fim de acordo com aquilo que é a sua verdade essencial, a verdade deles torna-se não apenas rectitudo, mas iustitia. Como principais conclusões, sublinham-se dois princípios defendidos por Agostinho e Anselmo: a convergência entre ser e dever, e o princípio segundo o qual todo o raciocínio humano é essencialmente axiológico, dado que se baseia na diferença entre a razão e a Verdade.

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Anselmo foi, como o seria um pouco mais tarde Abelardo, um dos mais eminentes adversários de Roscelino de Compiègne, considerado geralmente como o iniciador da posição dita vocalista no que diz respeito ao estatuto ontológico dos termos universais. É sobretudo no De incarnatione verbi que Anselmo desenvolve os seus argumentos contra as implicações teológicas e trinitárias das doutrinas de Roscelino, «herético da dialéctica», que defende que «as substâncias universais são simples palavras» (flatus vocis). Distante embora dos termos em que, desde o final do século XI, se configura a chamada «querela dos universais» (tributária do corpus da logica vetus, e designadamente das Categorias e do Peri hermeneias de Aristóteles, a que se juntam as Institutiones de Prisciano), a crítica de Anselmo a Roscelino, em si mesma e nos seus pressupostos, incide no entanto sobre alguns dos aspectos, dialécticos e semânticos, a que o debate nas escolas dará maior relevo. A essa luz, analisaremos aqui a crítica anselmiana à posição de Roscelino – que não distingue «o cavalo da sua cor», e que «não compreende como vários homens são um único homem na espécie» –, em particular no que diz respeito à relação entre substância e acidente (ou qualidade, segundo a gramática de Prisciano) e à semântica do nome.

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Na distinção 27 do Comentário às Sentenças de Pedro Lombardo, na questão onde o sentido próprio do conceito de “Verbo” se discute e se aclara, é a autoridade do pensamento anselmiano, conforme a sua exposição nas páginas do Monologion, que Boaventura convoca para a conclusão do problema e a resolução das dissensões. Tomando, por isso, aquele texto como ponto de partida da nossa incursão sobre a filosofia do monge de Le Bec, procurar-se-á reflectir sobre o carácter mediador do Verbo no acto da criação e sobre o modo como este constitui a chave de interpretação da questão filosófica do uno e do múltiplo. É esta relação entre o uno e o múltiplo, na qual se encerra o mistério da criação, que encontrará, por seu turno, junto da filosofia do Doutor Seráfico, fortes ressonâncias estéticas, firmadas sobre uma concepção de beleza, de matriz agostiniana, que a define como “aequalitas numerosa”, que o mesmo seria dizer, como unidade da multiplicidade.

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No presente artigo analiso a leitura feita por Roberto Kilwardby das teorias de Agostinho e de Anselmo sobre o verbum mentis. O artigo está dividido em três secções. Na primeira, analiso como o critério de Kilwardby para a distinção pessoal na Trindade divina (por via de origem) é aplicado aos poderes da mente racional. Kilwardby considera a compreensão anselmiana da solução de Agostinho, incapaz de suportar a distinção real das pessoas. Nas duas restantes secções, ocupo-me dos dois modelos do pensar: o pensamento como fala (secção dois) e o pensamento como visão (secção três). Defende-se aqui que Kilwardby aceita o modelo da visão e rejeita o modelo da fala.

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O estudo que apresentamos consiste numa análise das terceiras vias anselmiana e tomista, duas vias existenciais, já que nelas a existência é o ponto de partida e o de chegada. O percurso de ambas é essencialmente idêntico, conduzindo a existência do ente possível à conclusão da existência do primeiro ente necessário. A sua leitura comparada revela um maior número de convergências do que de divergências quer quanto à estrutura argumentativa quer quanto à fundamentação metafísica. Com efeito, os princípios metafísicos que as sustentam – identidade e não contradição, razão de ser, causalidade, participação – são os mesmos, ainda que formulados de modo diverso.

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Henrique de Gand foi um leitor atento e crítico de Santo Anselmo. O presente artigo persegue essa relação, mormente para o caso do argumento anselmiano, mas prefere apostar numa leitura do argumento metafísico de Henrique, tal como o apresentou J. Gómez Caffarena, a fim de concluir que, mais do que um problema de Deus, em filosofia, importa falar do mistério de Deus.

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O propósito deste trabalho é mostrar alguns aspectos que caracterizam a leitura que os filósofos analíticos dos anos 60/70, do século passado, fizeram do argumento do Proslogion de Santo Anselmo trazendo, deste modo, uma nova luz a esta problemática. Tiveram também o mérito de inscrever a questão da existência de Deus no âmago da filosofia analítica até aí dominada pelo ateísmo. Na Introdução salientamos as objecções analíticas mais frequentes feitas ao argumento – (i) a existência não é um predicado (ii) o conceito de Deus é incoerente (iii) a existência não é perfeição. Anscombe – uma excepção no contexto analítico – defendeu e demonstrou a tese de que o argumento não é ontológico. Malcom descobriu dois argumentos no Proslogion: um no Capítulo II que considerou inválido, outro no capítulo III que considerou válido e interpretou como modal. Plantinga foi um dos primeiros críticos desta prova modal porque o autor confundia entre necessidade de dicto e necessidade de re. Plantinga pensou que os dois argumentos se implicavam e\ou complementavam e desenvolveu uma teoria do realismo modal através da qual explica a natureza e a necessidade divinas em termos de mundos possíveis. Baseado neste conceito reelaborou uma nova prova modal que considerou “victoriosa” mas que veio mais tarde a ser refutada por Mackie, Tooley e David (entre outros) e acusada de circularidade. Plantinga não aceitou que a sua prova fosse reconhecida como falaciosa e Oppy também não aceitou a mesma reclamação expressa por Fergie. Contudo, Plantinga refez a sua prova e condensou-a numa única premissa: “a máxima grandeza é possivelmente instanciada”. Mais do que uma prova da existência de Deus trata-se de uma defesa da aceitação do teísmo, uma justificação da racionalidade da fé. E a possibilidade de existência de um ser metafisicamente necessário impõe-nos uma reflexão profunda donde se podem extrair todas as potencialidades cognoscitivas do labor do filósofo.

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O liberum arbitrium, para Santo Anselmo, não pode residir no poder permanente de pecar e de não pecar (posse peccare et non peccare), porque tal definição tornaria inútil «a graça, a predestinação e a presciência de Deus» (DLA, I, 207, 1-2). Por outro lado, se nós não tivéssemos sempre essa potestas, o pecado não poderia ser-nos imputado porque nós pecaríamos «sine libero arbitrio». Procurando separar esta alternativa, que lhe parece armadilhada, Santo Anselmo busca uma definição de libertas arbitrii independente do poder negativo de pecar (potestas peccandi) e, a partir da distinção entre voluntas propter se (instrumentum volendi) e voluntas propter aliud (usus sive opus volendi), julga encontrá-la na seguinte: a libertas arbitrii é «o poder de guardar a rectitude da vontade pela própria rectitude» (DLA, III, 212, 19-20: «potestas servandi rectitudinem voluntatis propter ipsam rectitudinem»), poder que exprime a exacta e positiva noção da «justiça original». À luz de tal definição transcendental de libertas arbitrii, comum a Deus, aos anjos e aos homens, pode Anselmo avançar a tese teologicamente mais ousada do opúsculo: nem Deus, apesar de poder «reduzir a nada uma substância que Ele fez do nada», é capaz de «separar a rectidão de uma vontade que a possui» (DLA, VIII, 220, 13-15).

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O presente artigo constitui um estudo da posição de Anselmo face ao uso do poder civil (autoridade secular), especialmente no período que medeia a sua nomeação para arcebispo de Cantuária (1093) e a reconciliação com Henrique I (1105), com base em algumas das suas Cartas. Articulam-se três pontos: 1. Pressupostos histórico-jurídicos, i.e, a Reforma Clunicense (como exemplo de governo translocal, hierárquico e colectivo) e a Revolução Gregoriana (como momento de ruptura fundamental na continuidade histórica da Igreja). 2. Apreensão anselmiana da questão acerca da justificação do poder: Anselmo reitera constantemente a sua fidelidade à autoridade apostólica, mas também reconhece uma certa legitimidade fora do domínio eclesiástico. Na linha de Gregório VII, a distinção entre os dois poderes pressupõe a primazia do papado (querela das Investiduras); contudo, a polarização no poder espiritual encontra sobretudo as exigências da razão (sola ratione), não do fideísmo. Eis por que Sto. Anselmo não poderia ter uma visão negativa do saeculum. 3. Nexo entre teologia e política: a separação, a concorrência, a interacção, entre as jurisdições espiritual e secular constitui a verdadeira fonte de determinação de significado conferido por Anselmo ao poder civil. O artigo conclui com as implicações positivas da noção anselmiana de poder.