12 resultados para Memória de forma

em ReCiL - Repositório Científico Lusófona - Grupo Lusófona, Portugal


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O problema da identidade pessoal, apresentado na nossa dissertação, tem como preocupação central discernir as condições que viabilizam a sua construção e permanência através do tempo, tendo como paradigma de interpretação o problema da relação do sujeito consigo próprio, com os outros e com o universo simbólico duma determinada época histórica. Assim, a identidade pessoal surge-nos indissociável da respectiva relação com o contexto sócio-cultural da contemporaneidade, onde a coexistência de múltiplos e díspares quadros de referência, impulsionam o eu em direcções distintas, provocando a sua exposição a modelos, valores e estilos de vida diferentes, por vezes até antagónicos, pela proliferação e intensificação dos processos de interacção social. A interioridade do sujeito existencial está agora “colonizada” por uma pluralidade de vozes, que concorrem entre si reclamando o seu direito à existência. Neste contexto, defendemos a ideia de que compete ao sujeito retirar de cada uma delas os elementos pertinentes que permitam a elaboração dos conteúdos pessoais da sua própria interioridade, ou seja, compete ao eu fazer uma síntese hermenêutica de carácter egológico que permita delinear os contornos de uma subjectividade distinta das demais. Esta ideia de identidade enquanto projecto pessoal, construído reflexivamente, dá origem a uma biografia organizada e coerente, uma escolha sempre provisória e continuamente revisitada entre mundos possíveis ou estados possíveis do mundo e do eu. É um processo individual de construção da identidade e do sentido, que transforma a “procura de si” num exercício constante de autoquestionamento existencial. Neste contexto, a interioridade contemporânea emerge a partir de uma rede de relações múltiplas que confrontam o eu com uma variedade enorme de experiências e situações existenciais, requerendo a capacidade e a elasticidade subjectivas necessárias a uma permanente interpretação do mundo e de si próprio, gerando um sujeito simultaneamente múltiplo e integrado, dotado de razão e de imaginação, capaz de construir e recriar continuamente novas formas constitutivas de si. No nosso trabalho, o problema da identidade pessoal não é perspectivado segundo uma concepção essencialista ou substancialista, baseada na imutabilidade dos indivíduos, mas sim numa perspectiva processual, segundo a qual a identidade é uma construção em permanente devir, uma consciência de si e da respectiva temporalidade. Neste sentido, o eu da contemporaneidade deve ser entendido como um processo em curso, uma identidade pluridimensional, que se constrói e desconstrói sem cessar, no âmago das diferentes relações que estabelece, quer consigo próprio (problema da reflexividade e da consciência de si), quer com os outros (problema da linguagem e da intersubjectividade comunicacional), quer ainda da ética e da orientação para o bem. Assim, a identidade pessoal é inseparável do conceito de alteridade, sendo o outro interno (dialogicidade da consciência de si) ou externo (intersubjectividade comunicacional). Esta concepção da identidade como construção e multiplicidade – construtivismo subjectivo - que defendemos no nosso trabalho, requer uma “gestão” correcta das diversas facetas do eu, actualizadas em função de contextos de interacção específicos, no sentido do auto-aperfeiçoamento de si, pela edificação e revisão constantes de uma matriz identitária forte e diferenciadora. Esta deve ser entendida não num sentido mecanicista, mas enquanto matriz em aberto, que se vai desdobrando e desocultando no fluir da temporalidade, onde coexistem vários critérios de unidade, várias modalidades de existir, segundo uma manifestação sucessiva de traços identitários actuais e inactuais, que se fenomenalizam ao longo do tempo num horizonte de experiência possível. Estamos pois a falar de uma subjectividade sem sujeito, no sentido em que não é uma subjectividade logocêntrica, não se desenha a partir da ideia clássica de unidade, nem se fundamenta num critério único de verdade. Antes se constitui através de um movimento contínuo gerador de novas formas de ser e modalidades de existir, no espaço das suas práticas e no horizonte das suas problematizações. É uma subjectividade enraizada no mundo, dialógica e relacional, que vai efectuando sínteses progressivas do seu trajecto existencial, através da dialéctica constante entre identidade e memória, enquanto forma de configuração e reconfiguração narrativa dos aconte - cimentos passados, da acção presente e das expectativas futuras, numa preocupação constante de autoconstrução de um sentido para a vida e para si próprio. A identidade pessoal enquanto matriz egológica que se constitui e reconstitui sem cessar ao longo do tempo é também um acréscimo de ser, um poder ainda vir a ser, reque - rendo por isso a assunção criativa da fragmentação do eu, num exercício permanente de reflexividade e narratividade, através do qual se ordena a temporalidade aleatória e episódica dos acontecimentos numa totalidade significante que conta a história de uma vida. Neste contexto, a ficcionalidade surge como instância de mediação eu-mundo, permitindo a formulação das inquietações e ambivalências do sujeito existencial num outro patamar ou nível discursivo, essencialmente metafórico e hermenêutico, pela retorização do problema original. A conversão do problema numa história permite ao sujeito re-interpretar a realidade para além da mera referencialidade, desvendando significados outros e configurando a sua polissemia intrínseca. A ficcionalidade surge então como poética do tempo reencontrado, descoberta e assunção de facetas insuspeitadas da identidade pessoal, pela reabilitação hermenêutico-criativa do passado, a qual possibilita a compreensão do presente e a perspectivação da acção futura. Esta constituição interpretativa de si a partir dos “testemunhos” da sua própria actividade é inseparável do exercício da “suspeita” e da provocação, no sentido em que o sujeito existencial não deve aceitar pacificamente as primeiras manifestações que acedem à consciência, mas submetê-las ao exercício da dúvida, enquanto forma de procura das motivações mais profundas e autênticas do seu próprio ser, estimuladas não só pela vontade como também pela afectividade, pela associação involuntária ou pela repetição convulsiva. A identidade pessoal enquanto construção e desconstrução permanentes de um eu simultaneamente múltiplo e integrado é, assim, o resultado de uma vida examinada, interpretada e narrada, de um si que se vê a si mesmo como um outro sempre possível.

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O presente estudo pretende propor a criação de um museu do território para o concelho de Alcanena baseado na necessidade de proceder à identificação, estudo e salvaguarda do património local colocando-o ao serviço das comunidades e do seu desenvolvimento sustentado. Tratando-se de um estudo de caso, irá nortear-se pelos princípios e pelas noções da nova museologia bem como na compreensão e entendimento da noção de ecomuseologia, trabalhando os seguintes aspectos: · As noções de património, identidade e memória, sua contextualização e a forma como as instituições museológicas fazem a sua apropriação; . O estudo da museologia no Século XX, baseada nas teorias museológicas contemporâneas da nova museologia, focando a importância que a defesa e salvaguarda do património detém na promoção de novos modelos de desenvolvimento a nível local, tendo como suporte a legislação nacional e internacional específica na área; · A importância que a promoção e implementação de um museu do território descentralizado e polinucleado no concelho de Alcanena poderá assumir no contexto da salvaguarda patrimonial e do desenvolvimento sustentado local; · Uma proposta concreta para a criação do Museu do Território do Concelho de Alcanena com vista à implementação do turismo sustentável visando o desenvolvimento económico e social das populações. O estudo realçará a importância das autarquias locais em todo o processo de salvaguarda patrimonial e desenvolvimento sustentável baseado no seu conjunto patrimonial.

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A memória auditiva é um misto de lembrança e de construção. É neste binómio que se jogam as nossas memorias áudio, quer as individuais, quer as coletivas. Este ensaio parte do conto de Ballard, The Sound Sweep, como forma de lançar estas questões. Em The Sound Sweep Ballard descreve-nos uma cantora de ópera aposentada que anseia pelo seu regresso aos palcos. A razão da sua decadência deve-se ao aparecimento de uma nova manifestação musical, a música ultrassónica. Madame Gioconda torna-se amiga de Mangon, um jovem mudo mas que ouve muito bem. Mangon tem por profissão ser uma espécie de limpador de sons. Opera uma máquina chamada sonovac que tem por função apagar todos os vestígios de sons antigos. Mangon, mais algumas pessoas do círculo de Madame Gioconda, montam a estratégia de organizar um espetáculo que será o seu regresso à atividade, espetáculo em que ela vai cantar mas não vai ser ouvida; o sonovac de Mangon estará lá para apagar qualquer vestígio de som sem que ela dê conta. Mas, à última hora, Mangon resolve destruir o seu sonovac e ela acaba por cantar... mal, muito mal, fazendo toda a gente sair da sala. A questão central a analisar é a da memória do som. Nesta ficção de Ballard há elementos interessantes que nos ajudam a refletir sobre esse tema. Parte-se da ficção de Ballard e lançam-se questões que estão bem presentes no universo real que habitamos. De certa forma, desenvolve-se também a questão de saber o que é que a ficção tem a ver com a realidade, sobretudo em termos de som e música.

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O presente trabalho de investigação, realizado no âmbito do Mestrado de Museologia da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, pretendeu analisar a importância da conservação de objectos e memórias no seio de processos museológicos, tendo tido como base de estudo o caso do Museu da Indústria da Chapelaria de S. João da Madeira. Partindo do princípio chave de que os objectos museológicos são mudos, no sentido em que por si não exprimem mais do que a dimensão da sua materialidade, procurou-se entender qual o papel da conservação de objectos e de memórias (individuais e colectivas) e como se articulam museologicamente a materialidade de uns e a imaterialidade de outros, na construção da(s) Identidade(s) de uma comunidade e o valor dessa identidade no contexto da afirmação cultural e social local, analisando-se desta forma o valor e papel do acto de conservação de objectos e da conservação de memórias individuais, inerentes à criação de um museu e, mais especificamente, do Museu da Indústria da Chapelaria. Para tanto este trabalho estrutura-se em dois momentos fundamentais. O primeiro momento, de carácter teórico, explora quatro conceitos fundamentais, o de conservação, o de memória, o de identidade e o de desenvolvimento local e a sua interligação no processo museológico. O segundo momento, o estudo de caso propriamente dito, analisa estas condicionantes à luz de um caso prático, o da criação de um museu no seio de uma localidade altamente industrializada que teve na produção de chapéus uma das suas maiores fontes de riqueza e afirmação sócio-económica. O objectivo da investigação passa assim por entender qual o papel das memórias individuais, no caso concreto, das memórias individuais de ex-operários da indústria da chapelaria, e a sua articulação com uma significativa colecção material, quer no âmbito restrito da criação do museu quer, de forma mais ampla e abrangente, da construção da identidade colectiva da comunidade, e em que medida o património industrial assim tratado é um meio facilitador para a compreensão dessa mesma identidade.

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Vivemos um paradoxo: a liberdade e a razão podem abrir caminho ao enfraquecimento das instituições democráticas. Os totalitarismos do século XX alimentaram as ambiguidades sobre essa conclusão. Stefan Zweig falou-nos de sociedade livres, que se foram metendo na lógica da “servidão voluntária”. Se a legitimidade do voto e a legitimidade do exercício tendem a confundir-se, o poder baseado na decisão popular tem de reforçar a sua própria legitimidade, prosseguindo o interesse geral e preservando os valores comuns. Urge apostar inequivocamente na cultura, na educação e na ciência, que têm de estar no centro das preocupações de uma sociedade actual – só assim a democracia pode reforçar-se como aprendizagem das regras e das escolhas. As regras não podem ser fins em si – têm de ligar-se a princípios e valores. Hoje, os europeus estão confrontados com a necessidade de antecipar a evolução para poder escolher bem. Teme-se um directório? Teme-se a f ragmentação? O directório europeu está-se a construir perante o vazio de alternativas comunitárias. Quanto mais nos afastarmos das propostas da Convenção mais reforçaremos esse indesejável directório dos grandes. A fragmentação continuará se não houver políticas coordenadas sobre o emprego e sobre a coesão, económica, social e territorial, e se persistirem orientações contrárias ao governo económico. A Europa é não só a história, mas também a capacidade de a superar, porque razão e liberdade não são projectos fechados e definitivos.

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“A memória não é um instrumento para explorar o passado, mas o seu teatro” (Walter Benjamin), cujos actores são pessoas comuns que recordam e recriam eventos passados através de diferentes formas de representação. Assim sendo, a memória é dinâmica e reconstrutiva e permite perpetuar a experiência, bem como criar e legitimar a identidade de cada um (Eber and Neal, 2001:37). O objectivo deste artigo é analisar os desenhos de Jack Sullivan sobre a comunidade das docas de Cardiff, conhecida como Butetown ou “Tiger Bay”, e a sua importância enquanto prática cultural na (re)construção de uma memória colectiva e imaginada. De que forma é que esta comunidade das docas é recordada e de que modo são as suas práticas quotidianas representadas através de desenhos? Quem e o que é que Sullivan representa? O que deixa na obscuridade? Como é que a memória individual se torna em memória colectiva? A este artigo subjaz a ideia de que os desenhos de Jack Sullivan, que estiveram na origem dos seus reconhecidos quadros compilados em Tramp Steamers, Seamen & Sailor Town, se apresentam como uma “forma de lembrança” de eventos passados, tanto para aqueles que viveram nesta área de Cardiff, como para aqueles que lhe eram espacial e temporalmente alheios. Estes desenhos constroem as memórias individuais e colectiva, tornando esta comunidade das docas acessível a todos.

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Que a linguagem consista num dos modos essenciais para conhecer o homem e o mundo é um dos fundamentos da consciência europeia. Ao mesmo nível encontramos a convicção de que a linguagem fornece uma ponte (talvez a ponte por excelência) para estabelecer comunicação. Nalguns períodos de história literária, deparamo-nos com um certo cepticismo em relação a este simples pressuposto: ao longo do romantismo, por exemplo, diversos autores exprimiram os limites da linguagem. Durante a “grande crise européenne”, o romance A Carta de Lord Chandos revelou, provavelmente, o cepticismo mais profundo quanto à capacidade da linguagem abrir caminho ao conhecimento do mundo e do sujeito. Um crise semelhante manifesta-se em Austerlitz de Wolfgang Sebald, um romance representativo da pósmodernidade. Num determinado momento, o protagonista “perde” a linguagem e, por conseguinte, a segurança de uma identidade pessoal consolidada. De forma menos afirmativa mas igualmente clara, surge ainda um momento similar em Moon Palace de Paul Auster, outro ícone pós-moderno. Uma análise destes dois romances pode ajudar-nos a compreender uma questão de extrema relevância: até que ponto é que a linguagem abre caminho ao auto-conhecimento e à comunicação?

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Neste artigo começamos por salientar que a memória, ou mais precisamente uma estrutura institucionalizada de memória, tem hoje um valor estratégico e constitui um activo importante tanto para os indivíduos como para as organizações, tornando-se objecto de complexas disputas estratégicas. Mostra mos então que não existe institucionalização bem sucedida sem que os edifícios de sentido que aspiram à visibilidade social (pessoas e imagens públicas, caricaturas, marcas, tecnologias, formatos televisivos, projectos editoriais, ambições ou denegrições, etc.) se acolham em estruturas institucionalizadas de memória a que se encontram associadas formas de cotação social – como sejam, para falar apenas das mais inesperadas, os júris residentes ou anónimos de espectadores televisivos, os júris de festivais de publicidade, os clubes de fãs ou as claques desportivas. Sustentamos que é apenas nesse momento que os edifícios de sentido vêem o seu valor reconhecido. De outro modo, é a queda no inorgânico que os espera, isto é, o anonimato social, político ou económico.

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O fenómeno marcas de comércio tem conhecido uma expressiva investigação nos últimos 20 anos, em consequência do crescimento da paisagem de marcas no universo económico. Na verdade, estamos hoje perante mercados sobrepovoados de sinais de distinção que procuram, a todo o custo, atingir a memória dos consumidores. Neste contexto, as marcas têm constituído fontes de valor acrescentado para as empresas e seus clientes, promovendo a diferenciação e apelo ao consumo. E um dos pilares desse capital-marca assenta na imagem positiva, ou percepção favorável que conseguem estimular na mente dos públicos-alvo. O presente artigo discute, precisamente, os conceitos marca, valor e imagem, procurando reflectir sobre a forma como a percepção das marcas se pode traduzir em valor simbólico e económico para as empresas.

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As organizações são responsáveis por uma significativa fatia das nossas experiências de vida e constituem um invólucro que raramente nos abandona, que atravessamos diariamente e nos deixa marcas, umas mais benévolas e gratificantes,outras aterradoras ou estigmatizantes. As organizações são tudo isto e ainda veículos, talvez dos mais importantes, que criámos para cooperar e, paradoxalmente, nos magnificarmos individual ou colectivamente. Neste nosso estudo procurámos descrever e interpretar o funcionamento das organizações, concentrando-nos em processos que consideramos hoje particularmente críticos: as institucionalizações de sentido. A nossa hipótese de partida levou-nos a sustentar que os processos de institucionalização e de auto-institucionalização desempenham um papel central nas sociedades actuais, submetidas mais do que nunca a brutais oscilações entre o orgânico e o inorgânico. A centralidade destes processos de auto-institucionalização tentada e, em alguns casos, consumada decorre do facto de se assistir a uma crescente impregnação do social e do pessoal pelo institucional como condição para uma maior eficácia quer dos indivíduos, quer das organizações. Institucionalizar significa encurvar a linha do tempo para fazer existir algo, criar um tempo próprio para que um nome, uma imagem, um valor, uma rotina, um produto, enfim, um edifício de sentido possa perdurar. Trata-se de um jogo que consiste em procurar as melhores oportunidades para os nossos projectos e ambições (aliás, no caso da nossa própria auto-institucionalização é como se disséssemos: suspenda-se o tempo linear para que esta representação ou versão mítica de mim possa existir e vingar). De forma mais dramática ou mais lúdica, tal tipo de jogo generalizou-se e tem como palco privilegiado, mas não exclusivo, os media. Em resumo: institucionalizar é sempre «ralentir son histoire» (Michel Serres), introduzir uma temporalidade mítica no tempo histórico da comunicação e ocupar um lugar numa estrutura institucionalizada de memória, retirando daí consideráveis vantagens simbólicas e materiais. Não restringimos, pois, estas observações à esfera organizacional. A compulsão generalizada a tudo tornar instituição arrasta-nos a nós próprios enquanto indivíduos, traindo um intenso desejo de permanecer, de resistir à volatilidade social, ao anonimato, de tal modo que podemos falar hoje em instituições-sujeito e em sujeitos-que-se-modelam-como-instituições. Pela sua própria auto-institucionalização os indivíduos procuram criar um campo de influência, estabelecer uma cotação ou uma reputação, fundar um valor pelo qual possam ser avaliados numa «bolsa» de opinião pública ou privada. Qual o pano de fundo de tudo isto? O anonimato, causador de tão terríveis e secretos sofrimentos. Alguns breves exemplos: a panteonização ou, aliás, a «vontade de panteão» de André Malraux; o processo de auto-santificação de João Paulo II, como que a pré-ordenar em vida o percurso da sua própria beatificação; o génio canónico dos poetas fortes, teorizado por Harold Bloom; o ímpeto fundacional que se manifesta na intrigante multiplicação no nosso país de fundações particulares civis criadas por indivíduos ainda vivos; ou, mais simplesmente, a criação de um museu dedicado à vida e carreira musical da teen-diva Britney Spears, antes mesmo de completar vinte anos. Mas, afinal, o que fizeram desde sempre os homens quando institucionalizavam actividades, práticas ou símbolos? Repetiam um sentido e,repetindo-o, distinguiam-no de outros sentidos, conferindo-lhe um valor que devia ser protegido. A ritualização, ou, se se quiser, um processo de institucionalização, envolve, entre outros aspectos, a protecção desse valor estimável para um indivíduo, uma facção, um agrupamento ou uma comunidade. Processos de institucionalização, e mesmo de auto-institucionalização, sempre os houve. Não encontraremos aqui grande novidade. Os gregos fizeram-no com os seus deuses, institucionalizando no Olimpo vícios e virtudes bem humanas. Quanto às vulnerabilidades e aos colapsos da nossa existência física e moral, as tragédias e as comédias helénicas tornaram-nos a sua verdadeira matéria prima. A novidade reside sobretudo nos meios que hoje concebemos para realizar a institucionalização ou a auto-institucionalização, bem como na escala em que o fazemos. A nossa actual condição digital, por mais que a incensemos, não muda grande coisa à questão de base, isto é, que as projecções de eternidade permanecerão enquanto o inorgânico continuar a ser o desafio que ciclicamente reduz a nada o que somos e nos faz desejar, por isso mesmo, ostentar uma máscara de duração. Defendemos também neste estudo a ideia de que as narrativas, sendo explícita ou implicitamente o conteúdo do instituído, são simultaneamente o meio ou o operador da institucionalização de sentido (não o único, certamente, mas um dos mais importantes). O acto de instituir é consubstancial do acto narrativo. «Instituir» algo é relatar, com pretensão à legitimidade, «quem é», «o que é» e «a que» privilégios e deveres fica submetido esse instituído, trate-se de uma ideia, valor, símbolo, organização ou pessoa. Mesmo quando a complexidade do discurso jurídico parece querer significar que se instituem apenas normas ou leis, bem como o respectivo regime sancionatário, o que, na verdade, se institui ou edifica (o que ganha lugar, volume, extensão material e simbólica) são sempre redes de relações e redes de sentido, isto é, narrativas, histórias exemplares. A institucionalização é o mecanismo pelo qual respondemos, narrativamente, à dispersão dos sentidos, a uma deficiente focagem da atenção social ou da memória, e procuramos estabilizar favoravelmente mundos de sentido, sejam eles reais ou imaginados. Apresentemos, muito sumariamente, algunspontos que nos propusemos ainda desenvolver: – Num balanceamento permanente entre orgânico e inorgânico (pois os tempos são de dispersão do simbólico, de des-legitimação, de incerteza e de complexidade), as organizações erguem edifícios de sentido, sejam eles a «cultura empresarial», a «comunicação global», as «marcas», a «imagem» ou a «excelência». Neste contexto, a mera comunicação regulada, estratégica, já não cumpre eficazmente a sua missão. – A institucionalização é um dos meios para realizar a duração, a estabilização de projectos organizacionais e de trajectos individuais. Mas nem os próprios processos de institucionalização se opõem sempre eficazmente às bolsas de inorgânico, potencialmente desestruturantes,que existem dentro e em torno da organização. Os processos de institucionalização não constituem uma «barragem contra o Pacífico». A erosão e o colapso espreitam-nos, ameaçando a organização, como ameaçam igualmente as ambições dos indivíduos na esfera pública ou mesmo privada. – Uma das respostas preventivas e, em alguns casos, também reparadoras de vulnerabilidades, erosões e colapsos (seja de estruturas,de projectos ou de representações) é a auditoria. As auditorias de comunicação, aliás como as de outro tipo, são práticas de desconstrução que implicam «fazer o percurso ao invés», isto é, regressar do instituído à análise dos processos de institucionalização. O trabalho de auditoria para avaliar desempenhos, aferindo o seu sucesso ou insucesso, começa a ser progressivamente requisitado pelas organizações. – Tivemos, aliás, a oportunidade de apresentar uma abordagem narrativa-estratégica de auditoria de comunicação, recorrendo, para o efeito, a algumas intervenções que acompanhámos em diversas empresas e instituições, as quais, em vários momentos, se comportaram como verdadeiras organizações cerimoniais, retóricas. Assim, começámos por destacar as dificuldades que uma jovem empresa pode sentir quando procura institucionalizar, num mercado emergente, novos conceitos como os de produto tecnológico e fábrica de produtos tecnológicos. Vimos, em seguida, como uma agência de publicidade ensaiou a institucionalização de um conceito de agência portuguesa independente, ambicionando alcançar o patamar das dez maiores do mercado publicitário nacional. Uma instituição financeira deu-nos a oportunidade de observar posicionamentos de mercado e práticas de comunicação paradoxais a que chamámos bicéfalos. Por fim, e reportando-nos a um grande operador português de comunicações, apresentámos alguns episódios erosivos que afectaram a institucionalização do uso de vestuário de empresa pelos seus empregados. Haverá um conhecimento rigoroso das condições em que funcionam hoje as organizações enquanto sistemas de edificação e de interpretação de sentido? Não o podemos afirmar. Pela nossa parte, inventariámos filiações teóricas, passámos em revista figurações, práticas e operatórias. Analisámos as condições em que se institucionalizam, vulnerabilizam, colapsam e reparam estruturas de sentido, seja nas organizações seja em muitas outras esferas sociais e mesmo pessoais. Um glossário mínimo – com conceptualizações por nós próprios criadas ou «afinadas» – podia contemplar as seguintes entra das, entre muitas outras possíveis: quadro projectado, quadro literal, mapa de intrigas, capacidade de intriga, tela narrativa, narração orgânica e fabuladora, narrativa canónica, edifício de sentido, estrutura institucionalizada de memória, memória disputada, cotação social, processo de institucionalização e de auto-institucionalização,institucionalização sob a forma tentada, actividade padronizada, trabalho de reparação de sentido. Diríamos, a terminar, que a comunicação, tal como a entendemos neste estudo, é o processo pelo qual os indivíduos e as organizações realizam a institucionalização, isto é, disputam, mantêm viva e activa uma memória e, ao mesmo tempo, previnem, combatem ou adiam as erosões e os colapsos de sentido que sempre acabam por vir dos seus ambientes interiores ou exteriores. A comunicação está hoje, claramente, ao serviço da vontade de instituir que se apoderou dos indivíduos, dos grupos e das organizações,e pela qual enfrentam e respondem aos inúmeros rostos do inorgânico, a começar, como tantas vezes referimos, pelo anonimato. Não estranharemos, então, que seja por uma comunicação com vocação institucionalizadora que marcamos e ritualizamos (fazemos repetir, regressar ou reparar) o que, para nós, indivíduos ou organizações, encerra um valor a preservar e que julgamos encerrar um valor também para os outros.

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The photographic image, either still or moving, is considered a fair and representative archive of past events, given its mirror nature of reproducing the world. However, in their purely documental function, photography or film do not represent the "tone" of the story that was recorded in the images. But it may be that it is the atmosphere that is expressed through the images that is able to awake memory and turn the story not only into something visible but also into something sensible.

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RESUMO: A presente investigação tem por objectivo estudar a relação entre os maus tratos na infância, a memória, e a afectividade negativa e positiva, em jovens residentes (N=55) em diversos LIJ e RA de duas Instituições da Grande Lisboa, comparando-os com um grupo de controlo (N= 39), de duas Escolas, uma Básica e outra Secundária, também da Grande Lisboa. Foram recolhidas respostas de 47 rapazes e 47 raparigas entre os 12 e os 16 anos, com uma média etária de 14.47 (DP= 1.37). As medidas utilizadas foram a Figura Complexa de Rey, para avaliação da Memória e o PANAS C, para a Afectividade Negativa e Positiva. A análise dos dados permitiu concluir que existem diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos para as dimensões em estudo, tendo piores resultados os jovens que sofreram maus tratos na infância o que corrobora a literatura sobre os danos causados por aqueles, a nível do sistema límbico, sede da afectividade e da memória. ABSTRACT: The present investigation aims at studying the relation between maltreatment in childhood, memory, negative and positive affectivity in youngsters (N=55) living in several Childhood and Youth Homes, as well as in Host Residences of two Institutions located in Greater Lisbon, in comparison to a control group (N=39) of two Schools, an Elementary School and a High School, also located in Greater Lisbon. Answers have been collected from 47 boys and 47 girls, between 12 and 16 years old, with an average range of 14.47 years old (SD= 1.37). The measures used were the Rey Complex Figure, for Memory assessment and PANAS C, for Positive and Negative Affectivity. The data analysis has enabled to conclude that there are statistically significant differences between these two groups for the dimensions in study, having worst results the youngsters that have suffered from maltreatment, confirming the reading about damages caused by it, at limbic system level, the seat of affectivity and memory.