217 resultados para LEITURA (CRÍTICA)
Resumo:
O principal ponto de desacordo sobre a abordagem kantiana do problema da verdade é se ela pode ser compreendida nos moldes da filosofia contemporânea como coerentista ou como correspondentista. Primando por uma consideração sistemática da argumentação de Kant em confronto com a literatura existente sobre o problema, este trabalho defende a segunda alternativa. Sustenta-se a tese de que a definição da verdade como a "concordância do conhecimento com o seu objeto" é cogente em todo o percurso do pensamento kantiano e que, nessa acepção, a verdade culmina por ser abordada não a partir de uma teoria estabelecida, mas como um problema cuja solução não pode ser dada nos limites da filosofia crítico-transcendental. Pondera-se, primeiramente, a literatura que situa Kant quer como coerentista quer como correspondentista e sistematiza-se a segunda alternativa em quatro grupos: a leitura ontológica, a leitura isomórfica, a leitura "consequencialista" e a leitura regulativa. Num segundo momento, em atenção ao período pré-crítico, argumenta-se que a alternativa coerentista deixa de se confirmar já nessa mesma época e que, na década de 1750, Kant descarta uma suposta teoria correspondentista isomórfica. Num último momento, considera-se a argumentação crítica e defende-se que a mesma concebe a verdade como um problema fundamental que não cabe ao tratamento de uma teoria correspondentista concebida de modo "consequencialista" ou regulativo.
Resumo:
O objetivo do artigo é discutir a crítica de Philonenko (1981) aos conceitos sartrianos de "má-fé" e "liberdade". Um dos pilares dessa crítica é a defesa da noção de "coerência do estilo", elemento indispensável para resguardar a autenticidade tão prezada por Sartre, segundo Philonenko. Contudo, continua este último, ao afirmar "eu não sou jamais nenhuma de minhas condutas, nenhuma de minhas atitudes", Sartre limita a liberdade por ele defendida ao horizonte de uma maliciosa dissimulação, quer dizer, da má-fé. Nós constatamos três imprecisões nessa crítica. Em primeiro lugar, a citada afirmação de Sartre foi mal interpretada. Mas, em segundo, se essa interpretação está correta, supondo que o estilo seja indispensável à autenticidade, ainda assim a liberdade sartriana não pode ser "para o mal", pois ela se caracteriza, em termos ontológicos, como o próprio ser da realidade humana "em situação", e não em termos morais, como uma propriedade dessa realidade, cristalizada por um olhar atento sobre si ou sobre o outro, e julgada como boa ou má. Por fim, queremos concluir que, numa possível conduta autêntica, a derrocada da má-fé não apenas prescinde do amparo a uma coerência do estilo como também pressupõe o reconhecimento angustiante de sua gratuidade.
Resumo:
seguindo a linha interpretativa de Deleuze, em Diferença e repetição, o artigo apresenta como, em Aristóteles e em Platão, a diferença é definida desde a primazia da identidade e como Deleuze rompe com ela, ao definir a diferença em si mesma. A filosofia da diferença deleuziana se compõe a partir da apreensão da diferença como virtualidade positiva e imanente, constituinte da univocidade do ser. No mesmo movimento, ela comporta uma crítica a toda filosofia que busca subordinar a diferença à representação, como em Aristóteles, em que a diferença está submetida à quádrupla raiz da identidade, da analogia, da oposição e da semelhança. Apesar disso, Deleuze explicita a noção de não-ser sem negação presente no Sofista de Platão como testemunho da potência da diferença em subverter a distinção modelo-cópia, ali onde havia um empenho em subordiná-la aos poderes da identidade e da semelhança.
Resumo:
A tese fundamental da Estética kantiana contida na Crítica do Juízo é a de que os juízos de gosto, eminentemente subjetivos, proferidos com base num sentimento de prazer desinteressado da existência do objeto julgado e não fundados em conceitos do entendimento ou ideias da razão prática, apresentam validade universal. "Universalidade estética" é o conceito-chave com base no qual a terceira Crítica, que já havia afrontado as estéticas racionalistas com a tese da não-conceptualidade do juízo de gosto, rechaça, no outro flanco, o ceticismo estético dos defensores de um gosto privado e incomunicável. Em sua versão expositiva e analítica, o tema da universalidade do gosto é discutido no segundo momento da Analítica do Belo, que se conclui com a tese de que "belo é o que apraz universalmente sem conceito". A essa conclusão Kant chega, tendo estabelecido no §8, entre outras coisas, a distinção entre a universalidade própria dos juízos reflexionantes estéticos e uma certa universalidade que se deve reconhecer em juízos determinantes de conhecimento teórico ou prático. À primeira, Kant atribui três títulos: o acima referido de "universalidade estética" (ästhetische Allgemeinheit), o de "validade comum" (Gemingültigkeit) e o de "validade universal subjetiva" (subjektive Allgemeingültigkeit). Quanto à segunda, a Analítica parece pretender batizar com os nomes supostamente equivalentes de "universalidade lógica" (logische Allgemeinheit) e "validade universal objetiva" (objektive Allgemeingültigkeit). O que defendo, no presente trabalho, é que a inteligência da noção de universalidade estética fica comprometida por três níveis de ambiguidade presentes no estabelecimento desses conceitos. Primeiramente, discutirei as dificuldades concernentes à apresentação kantiana dos conceitos de "universalidade" (Allgemeinheit) e de "validade universal" (Allgemeingültigkeit). Em seguida, buscarei mostrar o prejuízo da confusão presente no tratamento que o §8 confere às noções de "universalidade estética" e "validade universal subjetiva". Finalmente, vou sugerir que se deva reconhecer a distinção entre universalidade objetiva e universalidade lógica, com o fim de encaminhar a seguinte questão: a universalidade dos juízos de gosto se define prioritariamente no confronto com juízos que são universalmente válidos porque determinantes, dada a presença de conceitos do entendimento ou da razão no seu fundamento de determinação? Ou no confronto com juízos que são universais na medida em que não perdem a determinabilidade de seu valor de verdade quando seu conceito-sujeito vem a ser quantificado universalmente? Em poucas palavras, a universalidade do belo é anticonceptual ou apenas antilógica?
Resumo:
A partir do ensaio (1922) de Walter Benjamin sobre as Afinidades Eletivas de Goethe, o artigo tenta mostrar como Benjamin, desde esse ensaio de juventude até seu último texto, as teses "Sobre o conceito de história" (1940), defende uma noção de filologia crítica, capaz de evidenciar no detalhe material a distância histórica que separa a obra, em sua concretude histórica, do momento histórico do intérprete ou historiador. Somente o reconhecimento desse distanciamento permite não cair nas armadilhas da Einfühlung (identificação afetiva, empatia) hermenêutica e possibilita elaborar um posicionamento histórico e crítico.
Resumo:
Este texto pretende apresentar, de forma sucinta, um conjunto de estratégias de filósofos modernos para a retomada e crítica do ceticismo antigo, procurando destacar algumas semelhanças e diferenças
Resumo:
Fazer uma abordagem na qual seja apresentada a análise crítica de Reid acerca da teoria da identidade pessoal de Locke constitui-se como o objetivo principal desse artigo. Tal análise aponta para duas consequências significativas: a) se a mesma consciência pode ser transferida de um ser inteligente para outro, então, dois ou vinte seres inteligentes podem ser a mesma pessoa; b) a de que um homem pode ser e, ao mesmo tempo, não ser a pessoa que praticou uma determinada ação. Tendo como ponto de partida essas consequências, Reid explicitará algumas considerações em torno do assunto.
Resumo:
No presente artigo, traço, rapidamente, a perspectiva a partir da qual Marx constrói sua crítica ao capitalismo, a saber, a diferença entre o potencial transformador da técnica tal como desenvolvida sob o modo capitalista de produção e a sua realidade efetiva nesse mesmo sistema (parte 1). Com isso feito, argumento que a crítica de Marx ao sistema capitalista consiste em grande parte no fato de a valorização permanente do capital ser a meta da produção, uma finalidade irracional e que cria uma dominação abstrata desse mecanismo sobre os indivíduos (parte 2), de modo a, por fim, repensar o sentido de emancipação no pensamento marxiano tardio, sustentando, sobretudo, que se trata de uma emancipação dessa dominação abstrata que culmina, também, em uma emancipação do trabalho em prol da criação de cada vez mais tempo disponível (parte 3).
Resumo:
O pensamento de Karl Marx sobre a subjetividade humana é pouco conhecido e divulgado na língua portuguesa, e, no Brasil, particularmente, carece ainda de um estudo amplo, explícito e sistemático. Meu artigo pretende esboçar uma reflexão mais completa de sua filosofia sobre a subjetividade humana, insistindo não somente na crítica, mas também, e especialmente, na compreensão da referida questão, a partir de uma leitura imanente e estrutural de suas obras, no original. Vale ainda ressaltar que minha investigação se apoia na conexão entre subjetividade e objetividade, entre sujeito e objeto, inquirindo se há um determinismo da objetividade sobre a subjetividade, ou seja, se essas duas determinações são contraditórias no interior do pensamento marxiano, comprometendo, pois, as suas reflexões acerca da crítica à filosofia especulativa de Hegel e ao empirismo da economia clássica, ou se, na verdade, tal conexão é o segredo recôndito de sua filosofia sobre a subjetividade humana.
Resumo:
O objetivo do meu artigo é criticar a compreensão utilitarista do agente moral como átomo racional que está disposto invariavelmente a agir de acordo com o não sofrimento. Minha hipótese é a de que o utilitarismo esvazia os seres humanos de suas motivações para oferecer uma imagem opaca do agente moral. Por isso, ele é incapaz de solucionar dilemas morais que envolvem, por um lado, o autossacrifício por razões afetivas e, por outro, conflitos que opõem culturas distintas. Meu ponto é que não é necessariamente imoral a ação de um agente o qual sacrifica a solução ótima (proposta pelo cálculo utilitário e que privilegia a maioria), em nome de uma motivação afetiva, que julga que uma vida pode valer mais do que outra, nem o sofrimento é necessariamente imoral em todas as culturas de modo uniforme.
Resumo:
Após uma parte introdutória sobre o estatuto da filosofia da história como conhecimento, o texto procura analisar o corte efetuado por Habermas em sua trajetória teórica visando livrar sua teoria social daquela filosofia e, consequentemente, superar as teses acerca da construção de um sujeito da história e da exequibilidade da história. Com essa análise procura-se diagnosticar as transformações fundamentais que esse corte ou rejeição, por parte de Habermas, do pensamento próprio da filosofia da história trouxe para a sua teoria crítica da sociedade, e também apontar os rudimentos e traços daquela filosofia nessa teoria.
Resumo:
Busca-se acompanhar o desenvolvimento da teoria evolucionária no pensamento de Habermas, a partir da afirmação colhida no prólogo de Problemas de Legitimação do Capitalismo Tardio, de 1973: "O caráter programático evidencia que uma teoria da evolução social hoje se encontra apenas esboçada, mas que, no entanto, deveria constituir a base da teoria da sociedade". A atenção é direcionada à forma como Habermas reorienta o sentido evolucionário do desdobramento histórico à luz do conceito de mundo da vida, como esfera de realização da ação comunicativa. Objetiva-se investigar como é projetada nesse modelo de ação, por meio da linguagem, a tarefa de produção e reprodução simbólica do consenso normativo entre os participantes do mundo social, ao mesmo tempo em que Habermas sinaliza haver um telos de integração social imanente à própria prática comunicativa. Nesse sentido, procurar-se-á demonstrar que, assim como a pragmática universal serve de base teórica para a análise de processos de distorção da linguagem e de socialização anormais, a teoria da evolução social serve de parâmetro para uma teoria social crítica com intenção emancipatória de avaliar o desdobramento empírico e contingente da dinâmica histórica.
Resumo:
O texto busca compreender e avaliar as influências das filosofias políticas de Rousseau e Kant no pensamento habermasiano. Ele se atém sobretudo à ideia fundamental de Direito e democracia, segundo a qual há uma cooriginariedade lógica entre direitos humanos, interpretados como direitos fundamentais de liberdade individual, e a soberania popular, interpretada como direitos políticos de participação e comunicação, no processo de formação pública da opinião e vontade. Defende-se que a crítica habermasiana a Rousseau e a Kant se deve ao projeto de radicalização da democracia, para o qual as contribuições dos dois filósofos apresentam ainda alguns obstáculos. Porém, ao mesmo tempo, pode-se dizer que, segundo Habermas, a contribuição de um serve para sanar os problemas presentes na contribuição do outro.
Resumo:
O presente estudo pretende analisar a obra Cur Deus homo, de Santo Anselmo, a partir de uma perspectiva antropológica. Após examinar a peculiaridade do método e revisar seus argumentos fundamentais, será possível perceber que Anselmo revela uma perspectiva essencialmente boa da natureza humana, que, mesmo abalada, não sucumbe ao pecado original. A liberdade e o projeto amoroso do Logos originante fundamentam a concepção anselmiana em torno do homem e sua natureza.
Resumo:
Fazendo a leitura cruzada de um tardio ensaio de Kant – Anúncio da próxima assinatura de um tratado para a paz perpétua em filosofia (1796) – e da segunda secção do primeiro capítulo da Teoria Transcendental do Método da Crítica da Razão Pura, que leva o título "Disciplina da razão pura em relação ao seu uso polémico", tenta-se identificar e compreender a aparente contradição do programa da crítica kantiana da razão, o qual, se, por um lado, se anuncia com a intenção de resolver os intermináveis conflitos que têm lugar na arena da razão pura, superando o escândalo das aparentes contradições da razão consigo mesma e estabelecendo, enfim, a "paz perpétua em filosofia", por outro, conduz-se mediante um procedimento dialéctico inspirado na retórica judicial, fazendo apelo a um "uso polémico da razão pura", como sendo a forma mais adequada e, na verdade, segundo o filósofo crítico, a única disponível, para neutralizar, seja as pretensões do dogmatismo, seja as do cepticismo a propósito das questões metafísicas. Ao mesmo tempo que a nossa reflexão nos leva a caracterizar a pax philosophica kantiana e as pressupostas homologias entre a solução dos conflitos políticos e a dos conflitos especulativos, chega-se por ela também a reconhecer que toda a filosofia kantiana está originariamente determinada por uma concepção agónica da vida, da sociedade humana, do cosmos, da própria razão.