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em SAPIENTIA - Universidade do Algarve - Portugal
Resumo:
Teresa Martins Marques é professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e conhecida ensaísta no meio académico, sobretudo pelos trabalhos sobre José Rodrigues Miguéis e David Mourão-Ferreira. Em 2009 escreveu um conto, «Carioca de café», que já deixava antever a fluência da escrita, o mundano e o erudito fundidos nas personagens, tal como podemos encontrar neste seu primeiro romance, A Mulher que Venceu Don Juan.
Resumo:
É sempre um prazer ler o que Frederico Lourenço (professor de clássicas da Universidade de Coimbra) escreve. E escreve muito bem, seja como académico, seja como romancista, poeta, tradutor de autores gregos, reconhecido e premiado pelas suas magníficas traduções dos poemas homéricos Ilíada e Odisseia. A editora Livros Cotovia, que tem publicado a sua obra, é quem agora também apresenta esta sua adaptação para jovens do mais antigo texto literário da cultura ocidental. A Ilíada é uma obra do séc. VIII a.C., atribuída a Homero, descrita assim pelo tradutor, na introdução (p.7) à sua edição de 2005: «no fim de uma longa tradição épica oral, surge este canto de sangue e lágrimas, em que os próprios deuses são feridos e os cavalos do maior herói choram». Quem a leu, imagina o que terá sido o desafio de a adaptar para jovens. Quem a não leu, pode supor que adaptar uma longa obra de guerra e emoções não deverá ser fácil, sem que se percam elementos fundamentais que já foram perpetuados por mais de 2.500 anos de leitores e leituras sucessivas. Mas Frederico Lourenço consegue fazer esse difícil trabalho com muito sucesso.
Resumo:
Ultimamente, neste espaço do Cultura.Sul, tenho escrito sobre livros publicados há pouco tempo, mas isso tem acontecido por pura obra do acaso. Hoje, ao percorrer as prateleiras da minha biblioteca, parei na lombada azul de A Cidade de Ulisses, de Teolinda Gersão, datado de 2011 (o que, para quem gosta de livros com mais de 2000 anos, convenhamos que até pode ser considerado muito recente). Dividido em três capítulos, é o último (da p.159 à 206) que dá o nome ao livro, como se a cidade fosse o ponto de partida (o título) e de chegada (o capítulo final), como um ciclo que se completa, depois de muitas voltas e reviravoltas no percurso das personagens. Este é um livro muito interior, em forma de carta, onde o narrador expõe a sua vida, os seus amores, os seus mais íntimos pensamentos e ações. Inclusivamente, confessa vilezas, algo pouco comum, como já Fernando Pessoa ironizava no seu «Poema em Linha Recta»: Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? Fernando Pessoa que também apadrinha a exposição que o narrador, um artista plástico, elabora com/para aquela que pensa ter sido a mulher da sua vida, «Lisbon Revisited, numa nova versão, assinada por nós» (p.16).
Resumo:
Lívia Borges apresenta um segundo romance da saga Frescos de Pompeia. Digo «um» segundo e não «o» segundo, pois, como a autora tem revelado nas apresentações, quer de Julia Felix, o seu primeiro romance (v. Cultura.Sul, de agosto de 2011), quer deste, os seus livros foram desenhados como fazendo parte de um todo (alguns já estão mesmo completamente escritos), constituindo, no final, um vasto fresco da vida em Pompeios*, na época imperial. Este segundo romance de Lívia Borges tem como personagem principal uma escrava, que aparecia muito secundariamente no primeiro romance. Por seu lado, Julia Felix entra aqui, não como protagonista, mas como antagonista e propiciadora de muitas situações difíceis que Vera tem de viver e suportar. Uma forma inteligente de nos prender a uma coleção e de nos fazer ansiar pelo volume seguinte. E, apesar de haver uma relação lógica entre eles, a nossa ordem de leitura pode ser variável. Um desafio.
Resumo:
Releio a epígrafe de As Primeiras Coisas (Quetzal, 2013), romance de Bruno Vieira Amaral (mais conhecido como crítico literário e autor de um outro livro, muito útil e usado por muitos jovens às voltas com a disciplina de Literatura, Guia para 50 Personagens da Ficção Portuguesa): «‘Por toda a Hiroxima, as paredes e outras estruturas que permaneceram de pé preservaram sombras de pessoas ou de objectos. Todas elas na direcção do clarão de luz. A criação de tais imagens é semelhante à marca deixada no braço por um relógio no fim de um dia ao sol na praia.’ Charles Pellegrino, O Último Comboio de Hiroxima». E tudo faz sentido. Se não tivesse que dar mais informações sobre o livro, diria que As Primeiras Coisas é constituído pelas sombras de pessoas e objetos que marcaram o percurso de Bruno (personagem homónima do autor e que com ele partilha algumas características, como o próprio admite. Para que fique claro, sempre que mencionar apenas este nome próprio, é à personagem que me estou a referir).
Resumo:
Neste novo livro, António Manuel Venda situa os acontecimentos numa edilidade na serra, nunca nomeada. Sabendo nós que o autor é de Monchique, podemos deduzir que pode ter sido a sua fonte de inspiração, mas deste modo torna-se mais ambíguo, mais universal, e pode-se aplicar a muitas outras terras por esse país fora. O mesmo se passa com os nomes: exceto a bruxa (Maria Cadela) e os diabos (Diabo e Diaba), ninguém ali tem nome próprio, mas são todos conhecidos pela profissão que exercem: o especialista, o funcionário, o vereador, o guarda, etc. O título diz-nos que se trata de um livro de contos, mas, na verdade, os dez casos ali narrados mais parecem capítulos de uma novela, pois entreligam-se entre si, não só pelas personagens que se repetem de história para história (o presidente da câmara, protagonista ou personagem secundária, aparece quase sempre), como pelas referências que são feitas e que remetem de uns para outros. Por exemplo, no último conto, «Com a cruz às costas», quando o presidente matuta no aproveitamento político que se pode fazer de um aparente milagre, discorre, ao mesmo tempo: «O milagre tinha mesmo pegado. Não tinha sido como o dos diospiros, que estava rapidamente a cair no esquecimento», remetendo o leitor para a história das «Duas nuvens furiosas em pleno Verão».
Resumo:
Carlos Campaniço lançou em maio um novo romance (que foi finalista do Prémio Leya 2013), demonstrando vitalidade e vontade de prosseguir esta sua já premiada carreira de escritor. Tal como nas obras anteriores – provavelmente por gosto e formação do autor, dado que a história é a sua especialidade –, também este é um romance de época, desta vez passado no início do século XIX: a narrativa acompanha Santiago, um jovem médico, partidário de D. Pedro, que se refugia, durante as Guerras Liberais (1828- 1834), numa vila longe de Lisboa, uma vila que é a terra que o viu (mal) nascer: «Olho a praça com um vagar que é ainda de saudade. Estes recantos e travessas, ruas e largos, continuam a ser os meus passos. (…) é aqui na vila que ouço o tambor do meu coração» (pp. 17-18). Naturalmente, ficamos com curiosidade para saber por que razão de lá saiu e por que se inibe em se fazer reconhecer diretamente pelos seus conterrâneos (apesar de não se esconder – sai da casa, expondo-se à vista de todos –, também não se identifica). Mas o motivo só nos é revelado no final. Até lá, vamos acompanhando, em capítulos intercalados, uns largos meses da vida de Santiago adulto e uns anos da de Santiago menino, de forma a ir construindo, paulatinamente, a sua história. Santiago não é propriamente um herói, um homem de altos padrões morais e de elevada consciência social, que luta e assume a consequência dos seus princípios e crenças. Não. Em Lisboa, Santiago teme pela vida e foge dos miguelistas; na vila, receia assumir quem é («Temo a reacção de Albano e de dona Odélia», p. 16;) e as consequências de ser acusado de herege («Fico aterrado com esta postura súbita do vereador », p. 53); no amor, enreda- -se com duas mulheres casadas e não tem coragem quer para cortar com uma que o persegue, quer para declarar a outra que a ama; e aceita fazer a corte a uma terceira, que não é tida nem achada nestas demandas. Porém, todas estas fragilidades fazem-no parecer mais humano. Ao mostrar a infância sofrida de Santiago, durante a qual foi maltratado, exilado e até, pode-se afirmar, sequestrado, Carlos Campaniço consegue fazer-nos simpatizar e empatizar com as suas fraquezas de adulto e até admirar a compaixão que ainda tem dentro de si, depois de tudo o que se passou (as lágrimas chegam- lhe facilmente aos olhos, quando perante a miséria humana e a doença).
Resumo:
Foi um prazer ler o último romance de Lídia Jorge, editado em março último, pela Dom Quixote. E as razões foram muitas. Porque fala de um dia da nossa história que me diz bastante: o 25 de abril de 1974. Apesar de ter dele apenas uma vaga ideia, foi sendo sempre falado na minha família e faz parte do meu presente. Porque reconheço grande parte da história ali contada, fazendo-me sentir cúmplice, quer do texto, quer dos acontecimentos. Porque o romance é um género que faz falta para contar a História. É um modo de chegar a muito mais gente que, depois de o ler (ou enquanto o vai lendo), vai ter vontade de ir procurar os outros livros – os de História não romanceada – para aprender sobre as horas daquela noite de 24 para 25 e sobre os seus protagonistas. Apesar da «transfiguração literária », como se lê na nota de edição, quem sabe se não os reconhecerá? E saltando muitas outras razões, porque é um livro muito bem escrito. As pontas que vão sendo soltas ao longo da narrativa juntam-se em outros momentos, completando quadros de sentido. Ana Maria Machada, a narradora, como participante da história, sabe tanto como nós sobre o que pensam as outras personagens, mas sabe um bocadinho mais do que, em certos momentos, conta. Por exemplo, quando a equipa de reportagem entrevista a viúva de um dos capitães de Abril (que percebemos ser Salgueiro Maia, apesar de apenas ser referido pela sua «alcunha doméstica», isto é, pelo nome que a mãe de Ana Maria lhe dera: Charlie 8) e tenta conseguir que esta diga quem queria mal ao marido, perante a relutância em acusar alguém, a «Machadinha» afirma «Nós sabíamos, mas não tão bem como ela, que as vinganças de que foram vítimas ele e os outros como ele, tinham tido autores concretos, nomeáveis, intérpretes e responsáveis, colocados no topo das estruturas criadas num país onde passara a haver liberdade para legitimar tudo e o seu contrário» (p. 249).
Resumo:
O ato de comer está intimamente ligado aos afetos. Os bebés sabem disso muito bem, tal como nós, que vamos acumulando, ao logo da vida, memórias de momentos saborosos, que valeram pelo paladar, sim, mas muito mais pela companhia. Chegaram à minha biblioteca, recentemente, dois livros que me fizeram recordar um terceiro que aqui estava já há uns anos. Como gosto de cozinhar, tenho muitos livros de culinária, mas estes três são especiais: todos eles falam de comidas e de receitas, é certo, mas, têm muito mais do que isso e, a mim, todos eles, por razões diferentes, me falam ao coração.
Resumo:
Fernando Pessanha (Faro, 1980), um jovem investigador e formador na área da História, publicou os seus dois primeiros livros de ficção em 2013, ambos pela 4águas editora. Já no primeiro livro, Encontros improváveis, as seis ilustrações que iniciavam cada história, da autoria de Artur Filipe, captavam os ambientes «improváveis» do texto, com o traço do conto «O Acidente » a anteceder o preto e branco, ou melhor, o preto com algum branco, do Hotel Anaidaug. Neste, talvez por ser mais pequeno (22 páginas de tamanho A6), o trabalho deste ilustrador ganhe um maior destaque.
Resumo:
É sempre um prazer e um desafio ler os livros de Mário Zambujal. Desde o marco que foi o sucesso do seu primeiro romance, Crónica dos bons malandros, que o deslocou da referência como jornalista (que nunca deixou de ser) e o colocou no rol dos nossos autores de literatura, a sua produção tem continuado a dar-nos bons momentos.
Resumo:
Não, não é uma gracinha minha nem é engano. É apenas o título bem-disposto do último livro de Paulo Moreira. Publicado pela Lua de Marfim no passado mês de outubro, foi escrito há quase 30 anos, tendo sido distinguido, em 1987, na 1ª Mostra Portuguesa de Artes e Ideias. O júri de então, constituído por relevantes nomes da literatura portuguesa (Agustina Bessa-Luís, Dinis Machado, Maria Ondina Braga, Fernando Dacosta e José do Carmo Francisco), recomendou a sua publicação. A vida deu muitas voltas e só agora essa publicação – em boa hora – aconteceu.
Resumo:
«A filha de um gramático deu à luz, após amorosa união, / uma criança do género masculino, feminino e neutro.» Depois de ler Em Português, Se Faz Favor (da editora Guerra e Paz, 2015), lembrei-me deste epigrama de Páladas (poeta de Alexandria, dos finais do séc. IV d.C.). Também Helder Guégués (não é engano, tem mesmo dois acentos), revisor de texto, encara a língua com humor e ironia, mas sempre com muita seriedade. São assim os seus comentários nos blogues (de que sou leitora assídua) que manteve (Assim Mesmo) e mantém (Linguagista) e nos quais se inspirou para muitas das entradas deste Guia Fundamental para Escrever bem, de subtítulo. Aí, onde o objetivo não é serem um tira-teimas da língua portuguesa, Helder Guégués é muito divertido, pela mordacidade com que critica os erros que vai lendo nos jornais e nos livros ou ouvindo na rádio e na televisão, muitas vezes nem explicando que erro é esse. Porém, nesta obra que não é para especialistas, mas que se dirige «antes a todos os falantes comuns que querem e precisam, exprimir-se melhor em português» (p.21), o autor contém um pouco o sarcasmo, tem o cuidado de explicar o que está errado e indica a forma correta. O livro tem exemplos de vários tipos (géneros, numerais, regências verbais, etc.), como se pode ver pelo índice, dos quais aqui vou apresentar apenas alguns, para ficarmos com uma ideia do que podemos aprender.
Resumo:
Esta página tem tido poucos artigos sobre obras de não-ficção, mas hoje reequilibro um pouco, ao escrever sobre o livro que António Branco (professor da Universidade do Algarve e seu atual reitor) publicou recentemente, intitulado Visita Guiada ao Ofício do Ator: um Método (Grácio Editor). Esta obra tem duas partes distintas: uma primeira, em que contextualiza a sua experiência teatral, a criação de um mestrado nessa área e consequente criação de um grupo de teatro, a assunção de pertença a uma determinada linhagem, da qual é um dos seus elos, estruturada sob a figura tutelar de Fernando Amado, através da atriz Manuela de Freitas. Aí se apresentam e discutem conceitos fundamentais, como os de genealogia, linhagem, autenticidade, ética, estética, técnica, mas também descrições de exercícios e outros aspetos práticos do ofício de ator, próprios de uma visita guiada (algo diferente de um manual). A segunda parte é composta por todos os documentos possíveis de obter sobre a atriz Manuela de Freitas, desde entrevistas que deu na televisão ou em encontros vários e que aqui são transcritas pela primeira vez, a textos por ela escritos e dispersos. Ficamos a saber muito sobre a sua vida como atriz e quais os valores sobre os quais fundou a sua postura no teatro.
Resumo:
Há um ano e meio escrevi neste jornal sobre Hotel Anaidaug, narrativa fantástica de Fernando Pessanha, que brevemente (assim o espero) poderemos ver em filme. Hoje, este prolífero autor proporcionou-me a oportunidade de escrever sobre a sua mais recente novela, A Devota e a Devassa, da qual já tive o privilégio de redigir o prefácio.