3 resultados para Escrita de si
em Repositório Científico da Universidade de Évora - Portugal
Resumo:
A ESCRITA NEGRA de VERGÍLIO FERREIRA Maria Antónia Lima Universidade de Évora/ CEAUL Num tempo de crise existencial justificada pela permanente inquietação dos indivíduos perante um destino incerto, inseguro e imprevisível, gerador de constantes sintomas de desorientação e de vazio antropológico, surge decerto uma profunda identificação com a obra de Vergílio Ferreira, um autor que confessou não ter nascido para “escrever coisas alegres”, sendo o seu romance Para Sempre considerado um livro pessimista, negro e macabro. Títulos como Onde tudo foi morrendo revelam bem esta falta de vocação do autor para o optimismo literário, essencialmente resultante de Vergílio ter desde sempre sentido trazer dentro de si um “eu” que “é para morrer”, o que lhe concedeu profunda consciência do absurdo negro da existência e dessa “estúpida inverosimilhança da morte”. Daí que a sua análise da condição do homem em face do mistério da vida e da morte inevitavelmente se desenvolva através de uma escrita negra que recria a solidão cósmica com que grande parte dos seus duplos-narradores se debatem, partilhando uma visão negra também comum a muitos protagonistas do film noir americano alicerçado na ficção policial de autores como Dashiell Hammett, Raymond Chandler e James M. Cain. Como Vergílio, esta geração de escritores e realizadores, além de partilharem o mesmo interesse pela construção da narrativa cinematográfica e pela mútua contaminação entre literatura e cinema, buscavam a autenticidade das suas personagens através da construção de dramas inteligentes permeados de niilismo e fatalismo onde seres solitários e moralmente ambíguos deambulavam, revelando corrupções sociais e humanitárias tão comuns ao nosso tempo. Como Humphrey Bogart, um dos actores americanos mais conotados com o noir, qualquer personagem central de Vergílio Ferreira poderia muito bem ter concluído que “things are never so bad they can’t be made worse”.
Resumo:
A ESCRITA NEGRA de VERGÍLIO FERREIRA Maria Antónia Lima Universidade de Évora/ CEAUL Num tempo de crise existencial justificada pela permanente inquietação dos indivíduos perante um destino incerto, inseguro e imprevisível, gerador de constantes sintomas de desorientação e de vazio antropológico, surge decerto uma profunda identificação com a obra de Vergílio Ferreira, um autor que confessou não ter nascido para “escrever coisas alegres”, sendo o seu romance Para Sempre considerado um livro pessimista, negro e macabro. Títulos como Onde tudo foi morrendo revelam bem esta falta de vocação do autor para o optimismo literário, essencialmente resultante de Vergílio ter desde sempre sentido trazer dentro de si um “eu” que “é para morrer”, o que lhe concedeu profunda consciência do absurdo negro da existência e dessa “estúpida inverosimilhança da morte”. Daí que a sua análise da condição do homem em face do mistério da vida e da morte inevitavelmente se desenvolva através de uma escrita negra que recria a solidão cósmica com que grande parte dos seus duplos-narradores se debatem, partilhando uma visão negra também comum a muitos protagonistas do film noir americano alicerçado na ficção policial de autores como Dashiell Hammett, Raymond Chandler e James M. Cain. Como Vergílio, esta geração de escritores e realizadores, além de partilharem o mesmo interesse pela construção da narrativa cinematográfica e pela mútua contaminação entre literatura e cinema, buscavam a autenticidade das suas personagens através da construção de dramas inteligentes permeados de niilismo e fatalismo onde seres solitários e moralmente ambíguos deambulavam, revelando corrupções sociais e humanitárias tão comuns ao nosso tempo. Como Humphrey Bogart, um dos actores americanos mais conotados com o noir, qualquer personagem central de Vergílio Ferreira poderia muito bem ter concluído que “things are never so bad they can’t be made worse”.
Resumo:
Caracterizado muitas vezes e talvez algo injustamente como um escritor que publicou sobretudo romances de ideias, expressão que não deixa de ser equívoca, é indiscutível que a obra de Vergílio Ferreira, nas suas múltiplas dimensões, transita frequentemente entre os territórios classicamente definidos como literatura e filosofia. Por isso, é habitual associar-se alguns dos seus romances, nomeadamente aquele que tem por cenário a cidade de Évora (Aparição, 1959), ao existencialismo sartriano. Essa colagem merece ainda assim ser questionada. Até porque, noutros passos da sua obra, Vergílio discute longa e pertinentemente algumas teses do autor de L’Être et le Néant (cf., por exemplo, as páginas 128-138, escritas precisamente em Évora, do Diário Inédito, 2010). Menos referida é, contudo, a relação que os escritos de Vergílio têm com outro filósofo francês, Jacques Derrida. Essa relação não é, com certeza, de circunstância. Aliás, deve-se a Vergílio aquela que é, seguramente, uma das primeiras tentativas de traduzir para a língua portuguesa a famosa expressão cunhada por Derrida: différance (cf. Espaço do Invisível II, 1976, pp. 82-83). A presente comunicação visa pôr em diálogo dois livros de Vergílio Ferreira que estão, como se sabe, intimamente vinculados entre si – Para Sempre (1983) e a Cartas para Sandra (1996) – com a matriz teórica derridiana, designadamente com as suas concepções de escrita, de destinação e até de destinerrância. Fá-lo-á sobretudo a partir de La Carte Postale – de Socrate à Freud et au-delà (1980), obra singular no próprio trajecto do filósofo francês em que se mesclam o diário e a ficção, a teoria e o género epistolar.